Sei que me filiei ao Pe-Ce-Bão em 1978 e que fui demitida de uma universidade católica quando o clero resolveu “limpar” o campus de comunistas, mas posso afirmar sem dúvida alguma que sou uma pessoa apolítica. O que não posso deixar de fazer é admirar um país como esse, e as comparações com Timor-Leste novamente vêm à tona.
Todos, inclusive eu, admiram os timorenses José Ramos Horta e Carlos Ximenes Belo que receberam o Prêmio Nobel da Paz em 1996 pela atuação como mediadores no conflito de Timor-Leste. O que muitos esquecem – ou nem sabem – é que em 1973, quando Henry Kissinger recebeu o mesmo Prêmio pelo acordo de cessar fogo no Vietnam, o vietnamita Lê Đức Thọ simplesmente recusou-se a recebê-lo. Vocês têm ideia de quanto culhão precisa ter um sujeito que recusa o Prêmio Nobel da Paz? Pois é isso aí... o povo vietnamita é assim.
Eles provaram ao mundo que podem andar com as próprias pernas ou, pelo menos, não precisam da muleta da ONU, e reconstruíram um país devastado por muitas guerras com as próprias mãos, sem ter que depender de centenas de organizações humanitárias que lhe jogassem migalhas enquanto enriquecem seus dirigentes. A comparação é inevitável, me perdoem.
Acho que já comentei por aqui que a independência de Timor sempre me pareceu com a independência dos adolescentes americanos quando vão para a universidade. Normalmente os jovens escolhem estudar em algum estado a mil milhas da casa dos pais que é para colocar entre eles e a família uma distância física além da emocional. Eles só não querem nenhuma distância dos bolsos dos papais que financiam a universidade, a moradia, o carro, e ainda pagam a fatura do cartão de crédito quando eles vão para a Flórida durante o Spring Break. Timor-Leste comemora sua independência. Independência de quem? Da Indonésia, de onde vem a comida, o combustível e até a Língua? De Portugal, de onde vêm os livros escolares e uma enorme verba para a reconstrução dos sistemas educacional e jurídico? E ainda assim eles se negam a aprender Português, ou seja, além de dependentes são mal agradecidos, preferindo falar o Inglês da Austrália que os achacam. Mal agradecidos e burros, ainda por cima! Desculpem, mas eu tenho que botar pra fora toda a mágoa e decepção que estou sentindo se não vou continuar me envenenando com esses maus sentimentos.
O Vietnam praticamente erradicou o analfabetismo enquanto que o Timor permanece com 50% de analfabetos. Considerando que há 86 milhões de vietnamitas contra pouco mais de um milhão de timorenses, deve dar pra desconfiar que ajuda demais atrapalha, pois parece que o povo perde o estímulo para correr atrás do que precisa, já que recebe tudo de mão beijada. A colaboração do Brasil para a manutenção desse estado caótico é o paternalismo com que trata os timorenses. Putz, fomos tão colonizados quanto eles e não podemos nem devemos tratá-los como se fosse por nossa culpa que eles permaneçam pobres e incultos. Certificar analfabetos em Português como aptos a lecionar na Língua que pouco conhecem, só porque são velhos demais para aprender e porque não há um sistema de previdência no país que lhes garanta uma aposentadoria, é irresponsável e só faz bem à consciência de quem faz cortesia com o chapéu alheio. Enquanto eu aprovo os Senhores Rodolfos e Alfredos no Profep e dou a eles diplomas de professores – quem sabe até para lecionar no secundário – estou sacrificando o futuro de centenas de crianças que permanecerão pela vida a fora a usar todos os verbos na terceira pessoa do singular, no Presente do Indicativo (*).
Os vietnamitas não são simpáticos. Não estou dizendo que sejam antipáticos, mas nada têm a ver com aquele estereótipo de asiático sorridente e subserviente. Eles não desperdiçam sorrisos nem tempo cumprimentando pelas ruas pessoas que não conhecem. Ao invés de investir esforços para ganhar simpatias e benefícios, os vietnamitas investiram na industrialização, no desenvolvimento sustentável e na modernização.
Hanoi comemora 1.000 anos no próximo dia 10 de outubro e, pelo que pude ver, a partir do dia primeiro, vai ser só festa na cidade. Eu não gostaria de rmorar em Hanoi nem por uma semana. Não gosto de viver perigosamente e teria que contar com um anjo da guarda muito poderoso para sobreviver atravessando as ruas naquele trânsito louco. O nível de estresse daquela gente está muito acima do que eu desejo para mim mesma nessa altura da minha vida, mas não posso deixar de admirar um povo que trabalha tão arduamente para tornar o país esse exemplo de superação. Gostaria que esse exemplo chegasse à ilha dos “lafaek sira” e que todo o potencial que os timorenses demonstraram ter como guerreiros não seja desperdiçado em lutas inglórias. o povo timorense parece ter vocação para ser herói, mas ser herói não é apenas ser bom de briga, mas saber lutar por algo que realmente valha a pena. Até agora, a independência de Timor-Leste parece só ter servido à causa do detentor do Prêmio Nobel e à sua malta, pra falar em bom Português lusitano, ó pá!
(*) Para quem não sabe, os timorenses só conjugam os verbos dessa forma e daí as frases ficam mais ou menos assim: “Eu vai a Baucau semana passada.” ou “Nós precisa do livro amanhã.”.
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