Olá!

Bem vindos ao diário de uma brasileira em Timor-Leste - uma meia-ilha no outro lado do planeta que a todos encanta com a magia do canto de uma sereia.
Ou seria o canto de um crocodilo? Bem... em se tratando de Timor, lafaek sira bele hananu... :-))

domingo, 3 de outubro de 2010

Acabou-se o que era doce…



“... quem comeu se regalou-se”, era assim que eu costumava dizer quando era criança e não sabia nada sobre pronomes reflexivos, e nem estou certa se sei alguma coisa hoje. I just made my point, e chega de falar Inglês, tô de saco cheio, mas a cabeça parece se programar para uma língua e demora um pouco para formatar um HD antigo como o meu.

Estou na varandinha do meu quarto no Masa Inn e o rapaz brasileiro (esqueci o nome dele, claro) acaba de passar e confirmar que vamos juntos para o aeroporto daqui a meia hora (sniff...). Tchau hotelzinho, tchau civilização! Fiz coisas aqui que eram tão triviais que nem me dava conta de que não as podia fazer há mais de oito meses, como por exemplo, telefonar pro McDonald’s e pedir pra entregar um lanche na minha porta. Bobagens, né? Mas são coisinhas do dia a dia de uma cidade grande que não se pode fazer em Timor-Leste. Coisas bobas, fúteis e sem importância, mas que dão aquele toque de familiaridade e fazem nos sentir em casa. Quando morei na América foi assim. Tirando a neve e a falta de jogo de cintura dos americanos, não me lembro de nenhum choque cultural de maior vulto. Em Timor a gente tem que passar cada dia contornando as dificuldades, grandes e pequenas, pra conseguir se adaptar e sobreviver. Lá há entrega em domicílio, mas é complicado, já que não há endereços. Bidau Lecidere, rua em frente ao Venture Hotel, residência do Padre Domingos Alves. E se o entregador não conhecer o padre? As ruas não têm nome e as casas não têm números. Já tive que ficar na esquina pra esperar por uma pizza, se é que se pode chamar aquilo de pizza. E no escuro, ainda por cima, com uma lanterna para sinalizar. Daí o gostinho especial dessa besteira de receber a entrega do McDonald’s no quarto.

Ontem meu olho direito, além de vermelho hemorrágico, doía como se eu tivesse levado um soco. Fui a uma farmácia grande na Jalan Legian onde me passaram um colírio e um anti-inflamatório e estou ótima de novo. Pensei até em ir à Jalan Teuku para me consultar no hospital onde fiquei internada quando tive dengue, mas era Sábado e a solução da farmácia acabou não sendo só paliativa, foi efetiva, então saio daqui com o corpo curado, mas a alma em pedaços. Um pedaço quer ficar, outro pedaço que rever Malaezinho, Roberto, Simone & Cia, Rose & Bapa, Gladcya & Sansão, Vlad, etc. O pedaço maior quer sair daqui direto para rever Rafael, Felipe e Evelina. Num mundo ideal eu teria todas essas pessoas juntas num lugar como Bali, mas onde se falasse Português. Estou querendo demais? Entào acorda, Telma, porque o Ketut já deve estar chegando e o guichê da Merpati me espera.

Tchau paraíso!

PS: Cheguei em Timor e estou de volta ao meu quartinho. Houve uma grande festa de desluto ontem e a varanda parece um chiqueiro. Nunca vi tanta mosca junta... Soube que ontem houve mais de 10 horas sem energia elétrica e o mecanismo de aquecimento de água não funciona há três dias. Fui literalmente recebida com uma ducha de água fria... E ainda faltam 75 dias...




sábado, 2 de outubro de 2010

Dança do Fogo e Praia de Lovina (Golfinhos)




Bali continua sendo, pra mim, o paraíso na terra, mas não tem mais aquela coisa de “novidade” como os outros lugares onde fui nesses últimos dias. É um lugar mágico, lindo, místico, mas acho que já fiz aqui a maioria das coisas que um turista médio faz na ilha. Ontem, depois da sessão habitual de compras – a última – fui para Uluwatu, um templo que já conhecia, mas nunca havia estado lá no por do sol nem havia visto a tradicional Dança do Fogo. Como já disse, Ketut, meu motorista maluquinho, continua sendo o único amigo que encontrei nos últimos 15 dias e resolvi pedir que ele trouxesse a família nesse nosso passeio. Foi muito legal. A esposa, Neli, além de não falar bem o Inglês, é muito tímida, mas dava pra ver como estava satisfeita com a oportunidade de sair numa excursão turística com o marido, coisa que ela nunca tinha feito. A filhinha, Nelinda, que completou um ano em Setembro, é uma bonequinha e adorou os macacos no templo. A dança, propriamente dita, não tem nada de especial e a maior diferença que notei, considerando outros espetáculos de danças balinesas, é que não há instrumentos e tudo acontece ao som das vozes de 60 homens num canto sem palavras. É interessante, mas o espetáculo mesmo fica por conta do sol se pondo emoldurado pelas montanhas e pelo templo na alto. Lindo!

















Hoje, Ketut veio me buscar às três da manhã para irmos à Praia de Lovina, no norte da Ilha de Bali. A razão para sair nesse horário mais que inconveniente, é porque são mais de duas horas de viagem e quem quiser ver os golfinhos nadando livres e felizes, tem que pegar o barco em Lovina antes do nascer do sol. É curioso esse espetáculo diário dos golfinhos. Havia mais de dez barcos com turistas e eles não ligaram a mínima. Na hora “marcada”, começaram a rodear os barcos – na verdade uns beiros semelhantes aos de Timor-Leste que fazem a travessia Dili-Atauro – e dançaram sem se preocupar com toda aquela gente que não lhes oferecia nem um pedaço de sardinha. 



Não consegui fotografar nenhum, mas consegui filmá-los. Infelizmente, também não consegui captar nenhum deles dançando já que não há ensaio nem treinadores e os golfinhos fazem o que querem e quando querem, mas foi incrível. O barqueiro disse que tínhamos sido afortunados, pois há muitos dias não apareciam tantos golfinhos ao mesmo tempo. Óbvio que não dá pra contar, mas calculo alguma coisa próxima de cem.


Saí do hotel tão cedo que ainda voltei a tempo de tomar o café da manhã que é servido até as onze, e ainda encontrei um brasileiro que trabalha na ONU em Timor e que também estava aqui no Masa Inn em junho. Pouco nos encontramos em Dili pra nos esbarrarmos aqui em Bali pela segunda vez. Ele também volta amanhã e combinamos ir juntos pro aeroporto. Não vou negar que estou torcendo pro vôo ser cancelado, de preferência por uma semana, mas tenho que encarar a triste realidade: minhas férias acabaram...




Pensei em ficar na piscina, de papo para o sol, mas juntando o fato de ter acordado às duas e meia da madrugada e de estar com uma infecção qualquer no olho direito, resolvi aproveitar as últimas horas de aluguel do DVD player para dormir assistindo um filminho. O filme de Julia Roberts não estreou aqui ainda, nem está à venda na lojinha aqui em frente e o jeito é esperar. Pode ser que eu possa comprá-lo numa daquelas lojas em Colmera antes de voltar pra casa. E, por falar nisso, faltam 77 dias pra isso acontecer e tem horas que a saudade dói tão fundo que dá vontade de largar tudo e correr pra abraçar minha mãe e meus filhos, mas eu vou segurar a onda. Amanhã serão apenas 76 dias... o problema é passá-los em Timor-Leste. Quem diria que um dia eu iria me sentir assim?











Dia Branco – mais um



Quando comecei a escrever nesse blog, tinha a intenção de postar diariamente alguma coisa. Não deu certo. Talvez por eu não ser das mais disciplinadas pessoas do mundo, talvez por passar dias e dias sem que nada de relevante acontecesse para merecer nota... não sei. Acabei deixando o blog de lado e mesmo quando havia algo que, no meu entender, era importante registrar, eu ficava deixando para depois, depois, depois... Bem, ontem foi um desses dias: um dia branco. Fiz, praticamente tudo que me havia programado fazer,mas nada de grandioso. Peguei o celular no conserto, comprei os presentes do Kleto e do Anderson, fui ao bairro das pratas e comprei lembranças para as mulheres da família e ainda passei no Body Works para fazer as unhas. Só não comprei o celular da Gladcya que, inicialmente, me pedira para levar remédios para gripe, mas na última hora, mudou de ideia e mandou um e-mail pedindo para comprar um Nokia, já que o dela foi perdido no INFPC em Dili. Não estou certa se devo usar o verbo “perder” para descrever o que aconteceu com o celular da minha amiga. Quando você esquece alguma coisa dentro do seu local de trabalho, onde todos lhe conhecem e podem identificar a quem pertence, se essa coisa não lhe for devolvida o verbo correto seria “roubar”, mas os timorenses têm outra forma de ver uma situação dessas. Depois do misterioso desaparecimento de mais de cinco mil dólares dos professores do Profep no ano passado, eles tornaram-se ainda mais arredios a qualquer comentário sobre coisas perdidas, desviadas ou sumidas, vindo de um brasileiro, tanto que subiram nas tamancas quando o Umberto – coordenador do Procapes – relatou o desaparecimento de uma luneta do laboratório de Física. Bem, a luneta tinha sido levada por um brasileiro mesmo que alegou tê-la tomado “emprestada”, mas foi ao INFPC na calada de um Domingo e, ao invés de devolvê-la ao laboratório, deixou-a num canto da sala anexa à biblioteca (que era o único lugar de onde tinha a chave) como se estivesse lá esquecida e não tivesse sido notada. Felizmente, tínhamos fotografado a sala na sexta-feira anterior e pudemos comprovar que a luneta não estava no lugar de seu surpreendente reaparecimento. Pois é, imagens valem mesmo muito mais que mil palavras e vou sempre ficar na dúvida se a bendita luneta teria sido devolvida se não tivesse sido fotografada, por acaso, na casa desse professor brasileiro, mas isso não é problema meu. O caso é que os timorenses se arrepiam quando qualquer brasileiro fala em sumiço do que quer que seja, e daí a pobre da Gladcya não tem a menor chance de receber seu celular de volta.

Fechei o meu dia jantando no restaurante cubano aqui ao lado do Masa Inn. Além deles servirem a comida mais próxima da nossa que pude encontrar até agora em Bali, eles têm Internet wi-fi e meu netbook identificou a rede de cara, já que eu tinha me conectado ali em junho passado. Na volta ao hotel, aluguei um aparelho de DVD para assistir uns filmes que comprei. Acredite se quiser, mas estou farta da HBO (rss). Eles repetem demais os filmes e já assisti Hurricane (com Denzel Washington) e Green Gardens (com Drew Barrymore e Jessica Lange) diversas vezes em quatro países diferentes. Bem, eu tenho que achar um motivo para retomar a vidinha de Rede Record Internacional em Timor-Leste, não é mesmo?

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Masa Inn

Não sei porque faço tanta questão de estar aqui. O café da manhã é sofrível, os quartos precisam de modernização, não tem Internet e a rua é das mais caóticas da cidade. Talvez o que me traga aqui todas as vezes que venho a Bali é a possibilidade de reencontrar meus fantasmas. Lembra-me a Telma loura, bronzeada e magrinha que chegou aqui pela primeira vez há exatos cinco anos. Quanta coisa mudou e nem estou pensando nos cabelos grisalhos – que, afinal já existiam, só estavam disfarçados – na pele tão branca que faz todos me confundirem com uma australiana, nem nos dez quilos a mais. Falo das coisas em que eu acreditava, dos ideais que levava como estandartes e, principalmente, da saudade que sinto daqueles dias e das pessoas com quem eu dividia aqueles momentos. Voltei a Timor para reencontrar tudo isso, mas fui exposta à realidade que me negava a aceitar. O passado não volta. O tempo é cruel e invencível. E se não posso vencê-lo, o jeito é unir-me a ele e aprender a não desperdiçá-lo. Quantas e quantas vezes já me passou pela vida a sensação de que deveria ter feito algo e que “agora já era”. Quantas vezes mais vou me sentir assim? Quantas oportunidades mais vou deixar passar? Suponho que ainda muitas, infelizmente a vida é assim... ou, pelo menos, minha vida é assim. Talvez um dia eu me torne sábia o bastante ao ponto de poder confiar na minha própria intuição, mas por enquanto, sigo em frente tentando errar menos, carregar menos arrependimentos.

Lembro da série televisiva “Arquivo X” cuja abertura apresentava a frase, “A verdade está lá fora.”. Que tolice! Só mesmo um seriado sobre extraterrestres para lançar um bordão desses. Talvez isso se aplique para marcianos e venusianos, mas para gente de carne e osso desse planeta, a verdade está aqui dentro. Já disse mil vezes que atravessei o mundo tentando encontrar a mim mesma. Acreditei ter me encontrado e me esquecido por aqui, daí tive que voltar para me buscar. Talvez este tenha sido o maior sucesso desse meu retorno à Ásia. Me achei de novo, só que não foi a mesma que pensei ter vindo buscar, mas uma outra que pode não ser tão glamorosa e atraente, mas é muito mais real e centrada. E é com essa Telma pouco interessante que vou conviver pelo resto da vida, logo é melhor ir aprendendo a gostar dela.

Viver sem alimentar ilusões e, de novo, sem colocar expectativas, vai ser difícil para uma sonhadora nata como eu, mas talvez tenha chegado a hora de, finalmente, amadurecer e se na idade da razão se sonha menos, talvez seja porque se tem menos necessidade de sono e há muito que me satisfaço em dormir apenas seis horas por noite. E, por falar nisso, já é quase meia-noite e amanhã Ketut vem me buscar cedo para me levar a Denpasar. Tenho que ir buscar meu celular no conserto e voltar ao infoshopping pra comprar o presente do Anderson. Também quero dar uma passada nas fábricas de joias para repor o colar perdido em Luang Prabang. Ah, e o bendito tênis do Kleto além dos remédios da Gladcya. Depois, estou pensando em ir a um spa feito o Body Works para depilação e manicure. Posso estar velha e gorda, mas se descuidar demais da aparência não vou conseguir me gostar de jeito nenhum (rss).

Vou dormir para talvez, em sonhos, encontrar os fantasmas impregnados nas paredes do Masa Inn, mas vai ser bom acordar e saber que os sonhos têm seu tempo e lugar, e que a realidade pode não ser tão dura de conviver quanto parece.

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Kuala Lumpur



Mais um aeroporto... Nessa viagem já passei pelos aeroportos de Dili, Bali, Jakarta, Singapura, Saigon, Hanoi, Luang Prabang, Siem Reap, e estou agora em Kuala Lumpur... de novo...

Tive uma passagem muito rápida, mas muito significativa por Kuala Lumpur em junho. Neste ano da graça – e das viagens – de 2010, viajei três vezes para fora de Timor-Leste (a primeira não conta, pois hospital, ainda que em Bali, não é viagem turística). Na primeira, em abril, tive o encontro com os animais. Cavalguei elefantes e camelos, abracei tigres e orangotangos e até tive cobras enroladas no pescoço. Na segunda, em junho, tive o encontro com o outro. Foi uma viagem de aprendizado profundo e de uma significação enorme na minha vida. Descobri que não sei nada sobre os seres humanos e que os 53 anos vividos não tiraram em nada minha inocência e credulidade nas pessoas. A parte boa dessas descobertas foi que, além de acreditar demais nos outros, também acredito demais em mim mesma e em ambos os casos demonstrei que posso estar errada. Nem todos são o que parecem, exatamente porque não tenho habilidade alguma de avaliar as pessoas através de um contato relativamente superficial. As pessoas precisam de tempo para me mostrar como são realmente e, se por um lado me decepcionei, também tive gratas surpresas. Qualquer hora eu conto sobre o anjo de hijab que encontrei no trem entre Surabaya e Yogyakarta...

Nesta terceira viagem, o encontro está sendo comigo mesma e acho que já era mais do que tempo disso acontecer. Antes tarde do que nunca!

Pois bem, já passei pela imigração na entrada e na saída e agora estou no meu “pintu” esperando para embarcar para Denpasar, onde espero que Ketut esteja para me levar para casa, digo, para o Masa Inn. Dessa vez trago presentes para Ketut e para sua filhinha que acaba de completar um ano. Eu tenho sorte de encontrar umas figuras dessas por aí, né? Quando a loja tornar-se importadora de prata de Bali, vou contratar Ketut como meu representante (rss).

A perspectiva de dormir QUATRO noites na mesma cama parece um sonho dourado. Teve lugar onde passei dois dias e ainda me mudaram de quarto, ufa! Quero li-te-ral-men-te lagartear no sol esses quatro dias. Sol, praia, piscina e nada de compras além do tênis do Kleto e de um presente especial para o Anderson que salvou meu laptop. Claro que não vou conseguir cumprir essa promessa, mas vou ao menos tentar. Afinal, dinheiro não cresce em árvore e ainda quero viajar mais uma vez antes de voltar para minha verdadeira casa. Tô que nem o ET com o dedinho iluminando ao apontar para o Rio de Janeiro no mapa :-))

PS: Amanhã estreia aqui o filme da Julia Roberts! Será que vai estrear em Bali também? Afinal, foi filmado lá e não aqui na Malaysia... Tomara! Tomara! Tomara!


Até a volta, Siem Reap!



Foi o que eu disse ao meu onipresente Li Hor ao despedir-me dele em frente ao aeroporto. Sentadinha no salão de embarque, já faço planos de voltar. Gostei demais de tudo aqui, apesar da “facada” de 25 dólares como “taxa de despedida”. Nem no Vietnam, nem no Laos tive que pagar nada, e como meu dinheiro está no fundo da valise de mão, todo enrolado, só me safei porque aceitam cartão de crédito. Eu tinha exatamente 24 dólares na carteira e eles não topam uma barganha aqui.

A viagem toda me fez muito bem, mas a estada no Cambodia foi especial. Se foi pelo clima espiritual dos templos e pagodes ou pela cordialidade do povo eu não sei, mas que aconteceu algum clique aqui dentro, isso aconteceu. Para começar, a minha mágoa por Timor-Leste começa a esmaecer, tanto que até respondi gentilmente ao professor timorense-sem-noção que me mandou um monte de material para editar no meio das minhas férias. Se ele tivesse feito isso alguns dias antes eu, provavelmente, teria dado uma resposta bem atravessada, mas agora a paz está voltando à minha alma e consigo até rir de uma coisa como essa. Se Timor e seu povo nada aprenderam comigo e isso me causa uma enorme frustração, ao menos eu aprendi muito com eles e tenho que agradecer por essa oportunidade. Desta vez não volto pra casa com aquela coisa mal resolvida como ficou em 2006. Sei que ofereci o melhor de mim, o que é muito bom, e se não foi o bastante, paciência, não vou fazer verão mesmo estando num grupo de andorinhas. E essas “andorinhas” se esforçaram, cada uma à sua maneira, mas todos os professores brasileiros tentaram fazer um bom trabalho em Timor-Leste, justiça seja feita. Se concordo ou discordo com a forma de trabalhar de alguns, é problema meu e não sou a senhora dona da verdade. A Capes escolheu os profissionais que enviaria a Timor sem preocupar-se com a experiência ou competência de cada um, mas acabou dando sorte num ponto: todos querem ganhar pontos no currículo e empenharam-se para sair de lá com o máximo de certificados possível. Se, por conta disso, recém-graduados são orientadores de pós-graduandos e são desenvolvidos alguns projetos dos mais estapafúrdios, aí já é outra questão, mas é inegável que as “andorinhas” brasileiras trabalharam com afinco.

Outra demonstração de que a paz invadiu o meu coração, está sendo a forma como estou encarando o problema de saúde do Rafa, meu filho mais velho. Quando estava em Hanoi, recebi um e-mail dele confirmando a suspeita que pairava sobre nossas cabeças há algum tempo. Meu filho está diabético. O pai morreu de infarto fulminante aos 46 anos e o tio, também diabético, morreu aos 44. O avô paterno morreu aos 43 do mesmo mal. Estou muito preocupada, é óbvio, e o que eu mais queria agora era poder pegar meu menino no colo e passar pra mim qualquer mal que o fizesse sofrer, mas não vou poder fazer isso, então... Estou encarando tudo com o máximo de serenidade possível e vendo como uma oportunidade de iniciar uma vida nova para ele, para mim e para Felipe, meu filho caçula, que, apesar de até agora não ter tido nenhum sintoma, tem a mesma hereditariedade e, consequentemente, as mesmas chances de desenvolver a doença. A partir de agora todos lá em casa teremos mais disciplina na alimentação e vamos fazer um programa para acabar com o sedentarismo. Da Guia, Chico e Carolina inclusive! Meu Deus, e ainda faltam 79 dias...

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Pra não dizer que não falei de flores




Vietnam, Laos e Cambodia, nessa ordem. O primeiro, o segundo e o terceiro.

Vietnam: “Me contou suas viagens e as vantagens que ele tinha/ Me mostrou o seu relógio, me chamava de rainha... Mas não me negava nada, e, assustada, eu disse não.”

Laos: “Indagou o meu passado e cheirou minha comida/ Vasculhou minha gaveta me chamava de perdida... Mas não me entregava nada, e, assustada, eu disse não.”

Cambodia: “Mal sei como ele se chama, mas entendo o que ele quer/ Se deitou na minha cama e me chama de mulher/ Foi chegando sorrateiro e antes que eu dissesse não/ Se instalou feito posseiro, dentro do meu coração.”

Pra quem diz que toda e qualquer situação da minha vida eu encaixo numa música do Chico, apesar do título do post ser o da música de Vandré, taí a descrição da minha viagem. Estou de malas prontas para deixar Siem Reap amanhã de manhã e o coração já está apertado. Tem tanta coisa para se ver, fazer, comprar... queria ficar aqui por, pelo menos, mais uma semana. Este é um lugar que vou fazer de tudo para rever! Menos mal que não volto direto para Timor. Os quatro dias em Bali vão ser o interlúdio entre esse novo amor e o “ex” do qual mal posso ouvir falar.




Pela manhã fui ao Museu da Guerra e só me lembrava do Roberto. Antes a gente tivesse vindo pra cá em abril ao invés de gastar fortunas na insossa Singapura. Depois fui conhecer uma fazenda de seda onde vi todas as etapas da produção do tecido. Pena que uma simples echarpe custe 89 dólares, mas ao menos comprei umas camisetas pra presentear amigos.







Na volta para a cidade – o museu e a fazenda ficam um pouco afastados do centro – resolvi pedir a Li Hor para me mostrar a vida das pessoas comuns, fora do eixo turístico e ele me levou num pagode onde os cambojanos fazem suas preces sem ser incomodados por turistas chatos como eu. Claro que também parei pra conhecer uma escola que, infelizmente, estava na hora do almoço e, portanto, sem aulas. Queria perguntar por que os alunos não fazem refeições na escola mesmo, mas fiquei sem graça já que estava sendo muito bem recebida, apesar de escola não ser ponto turístico, e não queria ser mais intrometida do que já estava sendo.


Voltando ao roteiro pra-gringo-ver, fui ao templo Preah Angchek, ao Palácio Real (só aos jardins) e ao memorial aos mortos nas muitas guerras que o país já atravessou. É uma coisa meio mórbida, com todos aqueles crânios parecendo admirar os jardins e o templo duma janelinha, mas cada um vela seus mortos à sua maneira, e essa é a deles. Entre um ponto turístico e outro, uma pausa no Mercado Central onde pensei ter feito boas compras... até chegar a noite e eu ir ao Mercado Noturno. Aquilo sim é lugar de pechincha!



Ainda fui ao Centro Cultural onde assisti a duas dramatizações que, claro, não entendi nada, mas as danças eram bonitas e o lugar também, apesar de ter um jeitinho “fake” que me lembrou Sentosa. Bem, é um lugar feito para mostrar as origens culturais do país e se presta a isso com perfeição. Achei legal a presença francesa aqui não ser tão forte como nos vizinhos, e não vi menção à França nesse Centro Cultural, mas devo ter passado batida e não ter reparado. Afinal, comi mais um sanduba no pão francês só para guardar o gostinho por mais 80 dias (rss).

Mais uma vez furou meu programa noturno para assistir a apsara, dança típica cambojana, que é apresentada no Canecão daqui. Tinha que ter feito reserva com antecedência e, como não fiz, me deram uma mesa tão longe do palco que achei que não valia à pena. Tenho tanta certeza que vou voltar ao país que nem esquentei a cabeça. Fui jantar num restaurante dentro do Mercado Noturno e fiz mais umas comprinhas. Agora, minha mala parece as bochechas da Chiquita quando ela decide fazer estoque de amendoins dentro da boca. Aliás, vi uns macaquinhos e me deu saudade dela, o que mostra que há ao menos um timorense que faço questão de rever.

Pois é... o lugar onde eu tinha menos expectativas foi que mais me agradou. Não tem aquela beleza esplendorosa de Bali, mas tem personalidade. Notei que os cambojanos têm a pele mais escura que quaisquer outros asiáticos e vai ver que é daí que vem essa aura de simpatia,de cordialidade na medida certa. Os cambojanos têm um quê de negão! Ainda volto para ver a apsara e, quem sabe, descobrir que tem um pouco de samba nessa dança.



segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Dá-lhe Cambodia!



Olha… estou até me sentindo culpada por quase ter excluído o Cambodia da minha rota nessa viagem... O Cambodia tá dando de dez a zero no Laos! O Vietnam é o Vietnam, já expliquei bastante por aqui minhas razões para querer conhecê-lo. Já tive a surpresa de ver que Hanoi é muito mais interessante que Saigon (Ho Chi Minh City), mas o Laos ficava na minha lista de lugares místicos e, como também já falei, me deixou um pouco desapontada. Sobre o Cambodia, além das histórias das muitas guerras e do governo de Pol Pot, eu na verdade pouco sabia e só acrescentei-o no roteiro para fechar a viagem pela Indochina e também por causa do templo Angkor cuja história só vim a conhecer pela associação com Borobudur, em Yogyakarta. Aliás, estou ainda para escrever sobre minha viagem à Ilha de Java em junho, mas vou ficar devendo.





Pois bem, estou hospedada no melhor hotel até agora nessa viagem, incluindo aí o hotel em Jakarta que não estava previsto. O curioso é que é disparado o mais barato, como tudo aqui. Estou encantada com Siem Reap, gente!

O aeroporto é até luxuoso, considerando o tamanho da cidade e, não enfrentei burocracia alguma, graças ao visto tirado pela Internet. Na hora de preencher aquelas papeletas que nos dão no avião, havia um campo para o número do visto e coloquei lá. Quando cheguei ao balcão da imigração, só avisei que já tinha o visto e me liberaram em dois minutos. Enquanto os gringos todos estavam na fila preenchendo mais formulários e pagando taxas, eu já estava pegando o taxi pra vir para o Angkor PhC Hotel. Ah, e aqui eles aceitam dólares em todos os lugares, logo, além de não ter que trocar dinheiro, também não é preciso ficar fazendo mil cálculos pra avaliar os preços das coisas. O taxi custou cinco dólares, pagos no balcão de controle do aeroporto.

A cidade não enche os olhos com a beleza das construções como Luang Prabang. No caminho entre o aeroporto e o hotel, achei que parecia mais uma miniatura empobrecida de Brasília, com um hotel atrás do outro, todos naquele gênero que detesto. Fiquei até com medo de ter escolhido um hotelzão daqueles, com mil quartos distribuídos em muitos andares, mas meu hotelzinho é bem aconchegante. O rapaz da recepção, Ming, fala um Inglês impecável, considerando que é asiático, e se prontificou a me orientar nas excursões aos pontos de maior interesse turístico, como aliás, também o fizeram nas recepções dos outros hotéis, não posso me queixar. A diferença foi que, ao invés de me oferecer um pacote milionário como em Luang Prabang, me indicou o risonho Li Hor e seu tuk-tuk.

Nessa última semana só não andei em lombo de burro, mas acho que falta pouco. Em Saigon contratei um motociclista – que desapareceu depois do primeiro museu – e acabei voltando ao hotel numa carroça puxada por um velhinho artrítico que me deu tanta pena que quase me ofereci para carregá-lo eu mesma. Nas outras cidades contratei taxis, vans, ônibus e barcos. Aqui estou para cima e para baixo sentada num tuk-tuk. Li Hor é tailandês e foi monge por dez anos. Me conquistou não só pelo sorriso, mas pelo bom Inglês e pela gentileza que fez me presenteando com um bambú cheio daquele arroz grudento que eles adoram por aqui. Acho que não vou conseguir comer aquilo, mas foi legal receber essa atenção.

Comecei almoçando num restaurante bem bonitinho onde recebi meu primeiro tem-mas-acabou da viagem. No cardápio, havia um prato de lagosta que custava 6.5 dólares, mas... acabei almoçando o inevitável arroz frito. De lá, fomos para o Templo Angkor e, por ignorância, comprei entrada para só um dia (12 dólares). Vindo a Siem Reap comprem a entrada para o número de dias que pretenderem ficar na cidade, pois não dá pra ver tudo num só dia. No meu caso, meio dia.

Sabe toda aquela energia mágica e espiritual que esperava encontrar em Luang Prabang e não consegui? Pois estava aqui em Siem Reap, esperando por mim. O lugar é tão especial que nem a multidão inevitável de turistas japoneses consegue atrapalhar. Bem... em parte. Algumas das fotos que parecerão mal enquadradas devem-se às minhas tentativas de evitar os japas. Japoneses, chineses, singapurianos, sei lá. Eles estão em todos os lugares, mas não os quero no meu álbum. Aliás, não quero turista algum além de mim mesma, claro, e nesse ponto os japoneses são ótimos, sempre tiram minhas melhores fotos.

Engraçado que eu queria pegar um ângulo especial do interior do templo, já que o exterior está em obras, cheio de redes de proteção horrorosas, mas tinha um homem parado exatamente no lugar onde eu queria me posicionar. Pulei na frente dele e reparei que um grupo de japonesas estava posando para uma foto e entendi que o cara só estava esperando que elas saíssem. Rimos da situação e trocamos algumas palavras em Inglês. Uns quinze minutos depois nos encontramos novamente e o homem estava conversando com outro... em bom Português carioca! Eles trabalham na China, em alguma coisa relacionada a petróleo, me parece, e estavam aproveitando uns dias de folga para fazer o mesmo circuito que eu.

De Angkor fui para Bayon e parei em alguns outros templos menores, não sem fazer umas comprinhas, é óbvio, mas sempre de olho no relógio porque tinha que encerrar o passeio às seis da tarde quando fecham o complexo. Li Hor sugeriu que eu fosse assistir o pôr do sol de cima de uma montanha, mas quando vi a escadaria preferi voltar para o hotel. Minha intenção era descansar um pouco e ir assistir um show de danças locais só que, para fazer isso, mal teria tempo para uma chuveirada e, além do mais, tinha que recarregar a bateria da minha câmera. Bem que Sansão me aconselhou a ter uma bateria de reserva, mas agora é tarde. Se der, vejo o pôr do sol e as danças amanhã. Por hoje, o show de beleza e a aura do lugar já foram bastante e certamente me fizeram um bem enorme.









Talvez tenha sido pelas preces dos monges, talvez pela calma dos cisnes no lago... minha câmera pode estar precisando de recarga, mas minha alma já carregou a bateria o bastante para enfrentar os últimos 76 dias que serei obrigada a passar ainda em Timor.

Bye-bye, Laos! Bom dia, Cambodia!



Hoje é segunda-feira, 27 de setembro e faltam 81 dias para eu voltar pra casa. São 08:30 AM e estou aqui no Laos, no aeroporto de Luang Prabang onde acabo de fazer o check-in para meu vôo em direção a Siem Reap no Cambodia.

O Laos é o país mais bombardeado do mundo


O dia de ontem foi bastante cansativo, apesar de agradável e proveitoso. Luang Prabang é realmente uma graça de cidadezinha e eu até poderia ficar por mais alguns dias, mas acredito que tenha visto quase tudo que um turista pode ver aqui.

O guia, Kio, me pegou no hotel bem cedo e fomos receber a benção dos monges na cerimônia dos donativos. As pessoas ficam postadas nas calçadas com cestas de arroz cozido e outras coisinhas, e os monges vêm em fila com panelas penduradas no ombro onde coletam as oferendas. Todos estão descalços, vestem-se com um pano cor de laranja enrolado no corpo e têm a cabeça raspada. Sinceramente, acredito que assisti a um grande espetáculo para turistas. Os monges fazem cara de saco cheio e se você demora mais que 5 segundos para fazer o bolo de arroz e colocá-lo na panela, seguem em frente sem nem olhar na sua cara. As mulheres ficam sentadas em esteiras no chão e os homens permanecem de pé, mas para os monges somos apenas um bando de gringos com máquinas fotográficas e tratando-os como a animais exóticos que se pode alimentar. Não senti nenhuma energia espiritual vinda deles e, provavelmente, não lhes ofereci também nada além de punhados de arroz e biscoitos.

Depois, começamos a peregrinação pelos pontos turísticos, sempre com muitas explicações do Kio. Fomos ao mercado matinal e, sendo Domingo, estava bem movimentado. De lá, fomos a alguns templos e fechamos a manhã com a visita ao museu Haw Khang. Comprar qualquer coisa por aqui é uma extravagância já que os preços são compatíveis com o fluxo de turistas. Na avenida principal onde fica a maior parte das lojas, Kio me disse que o aluguel é em torno de 400 dólares por mês, mas quem quiser alugar uma lojinha tem que pagar de cinco a dez anos de aluguel adiantado. Eles realmente têm que vender tudo muito caro para valer à pena!



Um dos templos, Phou Si Hill que, como o nome já diz, fica numa montanha e a subida pareceu interminável, mas a vista dos rios Mekong e Nam Khan compensou a canseira. Na hora do almoço voltei ao hotel pra tomar um banho e descansar um pouco antes de encarar o passeio de barco à Caverna do Buda.




A viagem de barco foi um bálsamo e me senti tão bem que até tirei um cochilo. No caminho, paramos numa vila onde preparam as bebidas alcoólicas mais estranhas que já vi. Eles chamam de uísque, mas como bons ex-colonizados pela França, fazem um vinho licoroso de arroz até saboroso. O estranho são os bichos que colocam dentro das garrafas. Há cobras e escorpiões enormes, além de um filhote de urso preto e outras barbaridades. Por falar em bichos, continuo a não ver ratos, porcos ou galinhas convivendo entre as pessoas.

Aqui parece que o povo não curte muito o hábito timorense de viver na merda. Também há tecelãs na vila e comprei algumas echarpes bem bonitas e baratas. A visita só saiu cara porque perdi ali um colar de prata com um pendente de madrepérola que vale uns 400 reais (preço que eu venderia o conjunto na loja). Na volta da caverna ainda paramos de novo na vila e Kio foi procurar pela jóia, mas no meio daquela pobreza, meu colar deve alimentar umas cinco famílias por algum tempo, então, saí no lucro.


A caverna também fica no alto de uma montanha, e tome subida! Meu maço diário de Marlboro mostrou seus efeitos e voltei ao hotel exausta e encharcada. Pegamos um temporal no meio do rio e fiquei pensando como a Helen reagiria, pois em alguns momentos foi tão apavorante quanto as ondas que enfrentamos na volta à Ilha de Jaco. Vi a chuva chegando de longe e não teve como proteger o barco da ventania e da água.





À noite saí caminhando pela vizinhança só para comprar alguma coisa para comer no quarto mesmo. Já estava cansada do arroz frito com frutos do mar, a versão laosiana do nasi gorem. Amigos, comi um sanduíche divino numa baguette legitimamente francesa! Que saudade de casa...




Luang Prabang foi para mim como aquele carinha super legal, bom papo, bom companheiro, mas por quem não se tem o menor tesão. Gostei do passeio, voltarei aqui se tiver oportunidade, mas não vou fazer nenhum esforço extraordinário para que isso aconteça. Agora vamos ver o que vem do Cambodia que, desde o início do meu planejamento, era o primo pobre do roteiro, ou seja, expectativas próximas de zero e daí pode ser que eu me surpreenda positivamente. Tô pagando pra ver!

   

domingo, 26 de setembro de 2010

Le Temple de Bouddha



 
Durante uma vida humana são raros os momentos de verdadeira paz em que não somos devorados pela expectativa nem pelo medo. Por mais que eu tenha estudado a filosofia budista, continuo a ter medo - já diz o sábio ditado que, quem tem... tem medo - assim como continuo a cultivar expectativas e, consequentemente, continuo a me desapontar e desapontamento gera sofrimento. 
 
Planejo essa viagem ao Laos há tanto tempo, li tanto e ouvi tantas pessoas falando sobre o país, que não pude evitar uma enorme expectativa que, como já seria de se esperar, falhou em muitos pontos.


 

Podem dizer que estou traumatizada, que ando estressada, ou coisa assim, mas que quando cheguei aqui e achei o aeroporto de Luang Prabang muito parecido com o aeroporto de Dili, me deu até um aperto no coração. Felizmente o taxi estava impecavelmente limpo, o motorista não era fedorento e a cidade, apesar de muito pequena é extremamente bem cuidada. Gente, vou completar uma semana sem ver um rato! 
 

O hotel é uma gracinha e a recepcionista, Neo, muito gentil. Organizou um tour completo para amanhã e me encaixou numa excursão em grupo hoje à tarde. O susto começou aqui: 90 dólares pelos passeios, e isso porque eu pechinchei bastante com toda a minha experiência adquirida nas lojinhas da Poppies Lane 1, em Kuta (Bali). Tomei uma ducha quente, dentro de um box, sem molhar o banheiro inteiro (rss) e fui caminhar pela vizinhança. Essa coisa deles manterem o estilo francês é bonitinha e acredito que atraia muitos turistas, mas juro que eu esperava por uma cidade mais "asiática". O hotel fica a poucos metros do templo mais antigo da cidade, Vat Xiengthong, e aproveitei para também comer um sanduba antes da excursão às cataratas Kuang Si. Eu disse sanduba? Le pain avec le fromage, poitrine fumée et tomates confites. 
 

A van foi pontualíssima e viajamos cerca de 35 quilômetros até chegar a Kuang Si onde tive a grata surpresa de encontrar uma reserva de recuperação de ursos negros. Nessas viagens eu já tinha me encontrado com tigres, elefantes e uma variedade de macacos, mas não tinha visto nenhum urso. Quase tive um encontro também com uma cobra, ao subir num tronco para fotografar um urso deitado numa rede, mas fui avisada a tempo e corri mais que diabo da cruz. 
 
A cachoeira é bonita e o lugar é bastante relaxante, mas não achei nada de tao especial assim. A melhor parte foi quando já estávamos voltando a Luang Prabang e um rapaz francês resolveu perguntar à japonesinha sentada a seu lado de onde ela era e a ouvi responder, "Brazil". Dei um pulo no banco e comecei a falar em Português com a moça. Ela é de São Paulo, está estudando Inglês na Nova Zelândia e aproveitou para passear pela Ásia numa folga do curso. "Não tenho sentimento nenhum politico ou social. Tenho, porém, num sentido, um alto sentimento patriótico. Minha pátria é a língua portuguesa." e eu não falava Português há quase uma semana. Assim com há quase uma semana eu tenho energia elétrica 24 horas por dia, há quase uma semana eu não vejo um rato, há quase uma semana não sou chamada de "Senhora rabo grande" na rua... 
 
Também paramos numa vila do interior para conhecer a vida regular dos laosianos e me senti mais ou menos como os turistas estrangeiros que chegam ao Rio e vão num jipe conhecer a Rocinha e o Vidigal. Logo na entrada, um grupo de meninas vendia pulseiras e todas rezavam o mesmo mantra: "Can buy from me, five thousand. Can buy from me, five thousand.". A pobreza do lugar e a forma como as crianças eram expostas para comover os turistas me deu um frio na espinha. Juro que não era isso que eu estava esperando ver numa república que, apesar de socialista, é tão espiritualizada. Na minha cabeça o socialismo aliado à espiritualidade geraria um povo que jamais imploraria por 60 centavos de dólar. 
 
Pouco antes de chegarmos à cidade, fomos surpreendidos por uma chuva forte que alagou as ruas em poucos minutos. Resolvi desistir da última etapa do programa que seria um passeio pelo mercado noturno. Cheguei até a me comprometer com Aida, a garota brasileira, de jantar num restaurante próximo à feira, mas além de estar extremamente cansada, não quero correr o risco de adoecer sozinha numa viagem dessas e acabei não indo. 
 
Amanhã é um novo dia e um dia que vai começar bem cedo, já que vou receber as bençãos dos monges que andam pelas ruas coletando alimentos às seis da manhã. Espero não ter que ser abençoada debaixo de outro temporal desses. 
 










 

Me, myself e o Vietnam



Sei que me filiei ao Pe-Ce-Bão em 1978 e que fui demitida de uma universidade católica quando o clero resolveu “limpar” o campus de comunistas, mas posso afirmar sem dúvida alguma que sou uma pessoa apolítica. O que não posso deixar de fazer é admirar um país como esse, e as comparações com Timor-Leste novamente vêm à tona.

Todos, inclusive eu, admiram os timorenses José Ramos Horta e Carlos Ximenes Belo que receberam o Prêmio Nobel da Paz em 1996 pela atuação como mediadores no conflito de Timor-Leste. O que muitos esquecem – ou nem sabem – é que em 1973, quando Henry Kissinger recebeu o mesmo Prêmio pelo acordo de cessar fogo no Vietnam, o vietnamita Lê Đức Thọ simplesmente recusou-se a recebê-lo. Vocês têm ideia de quanto culhão precisa ter um sujeito que recusa o Prêmio Nobel da Paz? Pois é isso aí... o povo vietnamita é assim.

Eles provaram ao mundo que podem andar com as próprias pernas ou, pelo menos, não precisam da muleta da ONU, e reconstruíram um país devastado por muitas guerras com as próprias mãos, sem ter que depender de centenas de organizações humanitárias que lhe jogassem migalhas enquanto enriquecem seus dirigentes. A comparação é inevitável, me perdoem.

Acho que já comentei por aqui que a independência de Timor sempre me pareceu com a independência dos adolescentes americanos quando vão para a universidade. Normalmente os jovens escolhem estudar em algum estado a mil milhas da casa dos pais que é para colocar entre eles e a família uma distância física além da emocional. Eles só não querem nenhuma distância dos bolsos dos papais que financiam a universidade, a moradia, o carro, e ainda pagam a fatura do cartão de crédito quando eles vão para a Flórida durante o Spring Break. Timor-Leste comemora sua independência. Independência de quem? Da Indonésia, de onde vem a comida, o combustível e até a Língua? De Portugal, de onde vêm os livros escolares e uma enorme verba para a reconstrução dos sistemas educacional e jurídico? E ainda assim eles se negam a aprender Português, ou seja, além de dependentes são mal agradecidos, preferindo falar o Inglês da Austrália que os achacam. Mal agradecidos e burros, ainda por cima! Desculpem, mas eu tenho que botar pra fora toda a mágoa e decepção que estou sentindo se não vou continuar me envenenando com esses maus sentimentos.

O Vietnam praticamente erradicou o analfabetismo enquanto que o Timor permanece com 50% de analfabetos. Considerando que há 86 milhões de vietnamitas contra pouco mais de um milhão de timorenses, deve dar pra desconfiar que ajuda demais atrapalha, pois parece que o povo perde o estímulo para correr atrás do que precisa, já que recebe tudo de mão beijada. A colaboração do Brasil para a manutenção desse estado caótico é o paternalismo com que trata os timorenses. Putz, fomos tão colonizados quanto eles e não podemos nem devemos tratá-los como se fosse por nossa culpa que eles permaneçam pobres e incultos. Certificar analfabetos em Português como aptos a lecionar na Língua que pouco conhecem, só porque são velhos demais para aprender e porque não há um sistema de previdência no país que lhes garanta uma aposentadoria, é irresponsável e só faz bem à consciência de quem faz cortesia com o chapéu alheio. Enquanto eu aprovo os Senhores Rodolfos e Alfredos no Profep e dou a eles diplomas de professores – quem sabe até para lecionar no secundário – estou sacrificando o futuro de centenas de crianças que permanecerão pela vida a fora a usar todos os verbos na terceira pessoa do singular, no Presente do Indicativo (*).

Os vietnamitas não são simpáticos. Não estou dizendo que sejam antipáticos, mas nada têm a ver com aquele estereótipo de asiático sorridente e subserviente. Eles não desperdiçam sorrisos nem tempo cumprimentando pelas ruas pessoas que não conhecem. Ao invés de investir esforços para ganhar simpatias e benefícios, os vietnamitas investiram na industrialização, no desenvolvimento sustentável e na modernização.

Hanoi comemora 1.000 anos no próximo dia 10 de outubro e, pelo que pude ver, a partir do dia primeiro, vai ser só festa na cidade. Eu não gostaria de rmorar em Hanoi nem por uma semana. Não gosto de viver perigosamente e teria que contar com um anjo da guarda muito poderoso para sobreviver atravessando as ruas naquele trânsito louco. O nível de estresse daquela gente está muito acima do que eu desejo para mim mesma nessa altura da minha vida, mas não posso deixar de admirar um povo que trabalha tão arduamente para tornar o país esse exemplo de superação. Gostaria que esse exemplo chegasse à ilha dos “lafaek sira” e que todo o potencial que os timorenses demonstraram ter como guerreiros não seja desperdiçado em lutas inglórias. o povo timorense parece ter vocação para ser herói, mas ser herói não é apenas ser bom de briga, mas saber lutar por algo que realmente valha a pena. Até agora, a independência de Timor-Leste parece só ter servido à causa do detentor do Prêmio Nobel e à sua malta, pra falar em bom Português lusitano, ó pá!

(*) Para quem não sabe, os timorenses só conjugam os verbos dessa forma e daí as frases ficam mais ou menos assim: “Eu vai a Baucau semana passada.” ou “Nós precisa do livro amanhã.”.

Ha Long: uma baía sem açúcar



Faltou o bondinho entre as montanhas ao fundo, né?


Hoje, antes de sair para o meu passeio à Baía de Ha Long, recebi um e-mail de uma amiga muito especial e que me conhece melhor que ninguém. Dentre muitas coisas que ela falou, comentando meus últimos posts aqui, foi que mais do que ir a museus para ver objetos, eu estava indo aos lugares para ver as pessoas, pois esse é o meu barato. Ela está mais do que certa! Exposições em museus podem ser vistas a qualquer momento através da Internet. Até mesmo fotos dos pontos turísticos mais badalados do mundo estão na rede para quem quiser apreciá-las. Com um pequeno domínio das ferramentas do Photoshop a gente pode até se incluir nas paisagens (rss). O que não se consegue fazer pela Internet, pela televisão, pelo cinema, é captar a energia de um lugar e de seu povo, e isso é o que estou conseguindo fazer de melhor nessa minha jornada comigo mesma.

Meu passeio à baía de Ha Long foi mais ou menos por aí. Não que a baía não seja bonita – é linda – mas para quem nasceu e se criou na Baía de Guanabara, desculpe Ha Long... sorry periferia! Foi muito legal o passeio de barco pelas formações rochosas e a visita à caverna de Dau Go foi nota mil. Tirei fotos entre estalagmites e estalactites já que nunca sei quem é quem. O banquete vietnamita a bordo do barco vai ficar na minha memória para sempre e até as compras que fiz, de lembranças para os amigos, foram incríveis. Tudo correu bem na viagem de 175 km (quem disse que são só 60?) apesar da irritante mania nacional do buzinaço que acontece até nas estradas e atrapalha aquela soneca que sempre tiro em ônibus.

Uma coisa curiosa é que não há trecho algum dessa estrada onde o homem não esteja presente! Deixa ver se me explico melhor... Em todos os lugares por onde passei, quando se sai de uma cidade para outra há uns trechos da estrada onde só há vegetação, ou seja, a natureza do lugar permanece intacta, a não ser pela estrada, mas ninguém vive ou trabalha ali. Nos 175 km que separam Ha Noi de Ha Long parece não haver um centímetro de terra improdutiva. Ou há comércio, escolas e casas, ou há plantações imensas e cheias de gente trabalhando nelas. Bem, se formos comparar com o Brasil, por exemplo, onde pode-se andar quilômetros e mais quilômetros sem ver um sinal de interferência humana, isso pode ser porque a diferença entre o número de habitantes por quilometro quadrado é de 22 no Brasil contra 253 no Vietnam. O curioso é que, se considerarmos só o Rio de Janeiro onde há 366 habitantes por quilometro quadrado, ainda assim passamos no Rio por muitos trechos de estrada onde há nada mais que floresta à volta. Talvez seja porque estamos todos amarfanhados na zona urbana da capital e nossa produção agrícola seja ínfima. Bem, os vietnamitas estão em todos os lugares e trabalhando sem parar.

Voltando ao passeio, com tanta coisa bonita para mostrar aos turistas, o guia se surpreendeu pelo meu interesse por ver escolas (curioso, né?). Entre o continente e a ilha da caverna há algumas vilas de pescadores. O que eles chamam de “vilas” são plataformas no meio do mar onde há alguns tanques para manter os pescados frescos. Alguns tipos de peixes que ainda estão pequenos para o consumo, podem ser mantidos nestes tanques por até três anos. Os pescadores e suas famílias vivem ali e em cada plataforma há uma escola para suas crianças. Fotografei e filmei as aulas – de Matemática, claro – com tanto interesse que o guia adivinhou que eu era professora.

Deixo o Vietnam levando um gostinho de “quero-mais”. Bem, faltam só 85 dias em Timor e isso já me dá um bom alento...

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Quartier Latin + Chinatown = Hanoi











Estou feito pinto no lixo!!! Depois de conhecer cidades como Singapura, Kuala Lumpur e Jakarta que, apesar de estarem na Ásia, poderiam estar em qualquer lugar desse mundo globalizado, finalmente encontrei o que queria ver por aqui. Hanoi pode não ser meu modelo de capital socialista, mas tem todos os ingredientes do Oriente exótico que tanto sonhava conhecer.

Não posso ser injusta com Bangkok, que também é uma cidade maravilhosa mas... o Vietnam é o Vietnam, entendem? Cresci na época em que o Vietnam estava em todas as primeiras páginas de jornais, cantava “Era um garoto/ que como eu/ amava os Beatles e os Rolling Stones”, assistia Platoon, Apocalypse Now, Mash e até fui ver Miss Saigon na Broadway. À medida que fui sobrevoando todos aqueles campos de arroz próximos a Saigon, parecia que Simon & Garfunkel estavam cantando ao fundo “Parsley, sage, rosemary, and thyme (Generals order their soldiers to kill)/ And gather it all in a bunch of heather (And to fight for a cause they've long ago forgotten)/ Then she'll be a true love of mine.”. Eu vim para Scarborough Fair, gente!!! Tirei foto junto à estátua de Lenin!!!




Bem, deixando de lado aquela Telma da década de 70, deixa eu falar sobre Hanoi. No post anterior eu tinha dito que a cidade se chama Ha Noi, mas na verdade há uma crase no “a” e o “o” tem, ao mesmo tempo, acento circunflexo e cedilha. A acentuação aqui é louca, parece potência de potência e o circunflexo pode ter acima um acento agudo ou um ponto de interrogação. Como será o teclado dos computadores aqui?





Como eu disse no título do post a cidade é uma mistura de Quartier Latin e Chinatown, já que a presença francesa aqui se faz mais forte ainda que em Saigon e a chinesa está em todo lugar mesmo. Como previsto, desembarquei às nove da manhã e cheguei ao hotel antes das dez, já que não tive que perder tempo com imigração. A recepcionista também foi uma querida e me arranjou um motorista para fazer um city tour à tarde. Amanhã vou conhecer Ha Long Bay, extremo norte, a 60 km de Hanoi, uma baía cheia de ilhas de formação rochosa muito interessante.




Andei por todos os lugares recomendados pelos websites de turismo e tirei dezenas de fotos. A cidade é linda e meu guia, Chin, falava um Inglês bem passável. No final do dia, me deixou no Bairro Antigo, próximo ao hotel, pra eu poder perambular um pouco sozinha e curtir as coisas do meu jeito. Fiz umas comprinhas (claro), sempre pechinchando – aprendi com os mestres, em Bali. Já vou sair daqui vestida como uma típica vietnamita, usando uma daquelas túnicas bem longas e abertas dos lados, sobre uma pantalona de seda. Pra não congelar no avião, comprei também uma pashimina que, afinal, era uma coisa que eu queria há tempo. Para converter (aproximadamente) dongs para dólares, eu estava dividindo tudo por 20.000. Parei pra pensar um pouco e vi que ficava mais fácil e mais próximo, tirar quatro zeros e converter em reais. A pashimina, por exemplo, custou 100.000 dongs ou seja, 10 reais. Mais fácil e rápido. Se eu der 20.000 dongs de gorjeta, dei 2 reais e parece que isso é uma boa grana por aqui, a julgar pela cara do rapaz que carregou minha mala por quatro lances de escada (rss). Vou acabar emagrecendo, não por dieta, mas por exercício físico mesmo.



Now, it’s HBO time. Nos dois hotéis em que fiquei na Indonésia só havia canais locais e estou quase compreendendo Bahasa Indonésia. Assistir HBO me faz sentir em casa, ainda que não tenha HBO no meu pacote da Net.

Até amanhã quando voltar do meu passeio de barco entre as ilhas vietnamitas :-))

Ainda sobre a aceitação do que o destino nos reserva



Estou no avião rumo a Hanoi. Na verdade, o nome é Ha Noi, mas toda vez que escrevo “Ha” o corretor automático entende que é o verbo “haver”, então vai ficar como Hanoi mesmo.

No check-in, me esqueci de pedir para escolher meu assento e a atendente me deu o 31-G. Desconfiei que não fosse na janela, o que prefiro, mas já era tarde e eu não ia criar caso por tão pouco. Pois não é que a fila 31 é exatamente uma daquelas que não tem bancos à frente e fica com bastante espaço para as pernas? 31-G é um assento quase de 1ª. classe nessa companhia aérea tão diferente de Merpati, Lion Air e Air Asia. A Vietnam Airlines é nota dez! Recebi um lencinho perfumado à entrada e mal o avião decolou, iniciou-se o serviço de bordo. São 7:40 h e já almocei risoto de camarão com um bolinho de legumes e mais uns vegetais não identificados, mas com bastante champignon misturado. De sobremesa, um pedaço de melancia, um de dragon fruit e, pasmem, um gomo de torange! Enquanto escrevo, bebo um chá delicioso e morro de medo de derrubá-lo em cima do netbook (rss).

É muito difícil saber quando lutar contra o destino e quando aceitar o que ele nos oferece. A pura aceitação passiva nos deixa como as viúvas da seca, carregando um filho morto nos braços e dizendo que foi a vontade de Deus (ou de paim Padim Ciço); a luta pela luta pode nos levar a um extremo perigoso e desagradável, onde as decepções tornam-se constantes já que não podemos ganhar todas as brigas. Há que se encontrar o caminho do meio, mas a fórmula para saber quando aceitar e quando lutar não está pronta em nenhum livro. A sabedoria vem da reflexão e é preciso ter a mente muito aberta para aceitar algo que, a princípio, vai contra nossas verdades totalmente absolutas, assim como ter a humildade de admitir que nossas verdades só são absolutas para nós mesmos. Aqui pelas redondezas de onde me encontro, a forma encontrada para abrir a mente e a alma é através da meditação e tomara que, em meio a essa correria de um hotel para o outro, eu encontre alguns momentos para limpar o meu âmago e abrir espaço para ver as coisas na exata dimensão que elas têm. Agora, tudo parece contaminado pela minha raiva e isso não é bom. O distanciamento físico do problema já ajuda, mas é preciso também um distanciamento emocional e eu não estava conseguindo fazer isso vivendo o dia a dia da missão Capes em Timor-Leste. Hoje é quinta-feira e desde Domingo não falo com ninguém do grupo e isso está me ajudando bastante, no sentido de me afastar realmente de toda aquela tensão. A solução do meu problema com Timor não é apenas sair de lá, já que isso é uma coisa que vou fazer mesmo daqui a 87 dias (rss). Se os timorenses são hipócritas cumprimentando a todos que não conhecem só pra fazer piada com aquele riso que pode significar tudo, menos alegria, não tenho nada a ver com isso. O que eu não quero é sentir raiva, e quando escrevi a frase anterior era esse o meu sentimento. Raiva, mágoa, indignação e decepção. Pra quê?

Bem, hora de desligar aparelhos eletrônicos e aterrissar em Hanoi. Depois continuo, okay?


So Far, So Good 2



Bem, acordei a tempo e o hotel já havia providenciado um taxi – com taxímetro – para me trazer para o aeroporto. O vôo para Hanoi vai atrasar 25 minutos, mas isso não é nada, já que não tenho conexão para pegar hoje.

Ho Chi Minh City é surpreendentemente grande e organizada. A colonização francesa se faz presente nos Cafés semelhantes a quaisquer Cafés que vemos nas esquinas de Paris, com a diferença que, ao lado do Café pode estar um pagode tipicamente oriental e que a comida servida não é nada parecida com croissants nem chocolat au lait. Não há muitos ocidentais à vista, e agora que estou no terminal doméstico, parece que sou a única “malae” na área.

O dinheiro aqui tem muitos zeros e a relação com o dólar é mais ou menos de 20.000 para 1, ou seja, ao pagar 120.000 dongs por uma corrida de taxi, gastei cerca de 6 dólares, o que é bem aceitável. Agora que aprendi, já comecei a negociar e pechinchei pra pagar por uma água de côco e até o preço da corrida de bicicleta.

Foi uma pena eu ter perdido meu dia de tours aqui em Saigon, mas espero cumprir minha agenda daqui pra frente. Vou chegar a Hanoi às nove da manhã e passar o dia vagando sem destino. Quero organizar uma excursão aos pontos turísticos para amanhã, de preferência com um guia que fale Inglês (ou Francês, quem sabe?). Essa história de programar uma viagem baseada em pacotes de agências turísticas não funciona muito bem... As agências têm uma infraestrutura que um particular não consegue ter, mas vou tentar aproveitar ao máximo, mesmo dentro do meu caótico planejamento. Ao menos, vou tirar boas fotos (rss).

Tchau Saigon, olá Hanoi! Além da oração a São Jorge, vou rezar também a meia dúzia de orações que peguei no avião da Lion Air. Eles têm um folheto com preces de seis religiões diferentes – islâmica, protestante, católica, hinduísta, budista e mais uma que nunca ouvi falar antes –, todas pedindo que o vôo seja bom e que os passageiros cheguem bem aos seus destinos. Supostamente, isso era para ser deixado no avião, mas depois do que eles aprontaram pra mim, achei-me no direito de trazer o folheto comigo. Qual será a punição para um pecador que rouba orações?

Bye!


quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Tantas palavras… meias palavras…



Acreditem, estou num apartamento EM SAIGON!!! Gastei tantas palavras no meu post anterior que o melhor será ficar apenas nas meias palavras agora. Falei em não lutar contra o destino e o segredo do sucesso, ou ao menos, da sobrevivência, passa por saber ler os sinais enviados por sabe-se lá quem.

Ontem, perdi minha conexão para cá. Hoje, quase fico em Singapura por poucos minutos de distração. Cheguei aqui e peguei um taxi que fez comigo o que muitos taxis ao redor do mundo fazem com os turistas: cobrou-me três vezes o preço regular! Tudo bem. O hotel é simpático, fica num lugar ótimo e é uma pena que meu dia tenha começado tão tarde por aqui. A visita aos túneis, já era. Encontrei uma graça de recepcionista, Suzy, que me orientou em tudo que pôde, e arranjou um motorista de moto pra me levar aos principais pontos turísticos. Comecei pelo Museu da Independência... e parei por aí. Ao sair, cadê o motoqueiro? Fumei um cigarro e meio esperando pelo cara e desisti. Apanhei um taxi regular e dei – uma boa volta pela cidade – no taxímetro, e fiquei num mercado popular aqui perto do hotel. De lá pra cá, vim numa bicicleta, pra fechar o ciclo de meios de transporte locais.

Minha câmera estava quase sem bateria e parei de tirara fotos tentando economizar para o show de marionetes à noite. Descobri que hoje não haveria o show das 20:00 h e estava muito em cima da hora para pegar o show das 18:00 h e foi a gota d’água para eu perceber que alguma coisa não está dando certo nesse meu passeio a Saigon. Bem, espero que todos os problemas tenham sido com Saigon e que daqui pra frente tudo corra bem melhor, mas por via das dúvidas, vou rezar a oração de São Jorge três vezes ao dia. ” Eu andarei vestido e armado com as armas de São Jorge para que meus inimigos, tendo pés não me alcancem, tendo mãos não me peguem, tendo olhos não me vejam, e nem em pensamentos eles possam me fazer mal.”. Êta olho grande virado da gota serena!

Terminei meu dia no apartamento... um pedaço de Saigon. Pedi uma pizza e um crepe de chocolate, só pra quebrar a promessa de não comer, e ainda tomei uma latinha de Heineken, à saúde dos amigos que ficaram em Dili. O barato agora vai ser ficar assistindo HBO e Discovery Channel, além de dormir cedo já que meu vôo para Hanoi sai daqui às 6:30 h da manhã. Ho Chi Minh City, fico devendo uma visita com mais calma noutra oportunidade.

De como as boas lembranças do passado devem permanecer onde estão ou Porque estou na contagem regressiva para voltar pra casa

Estou agora dentro do avião, rumo a Ho Chi Minh City, mais conhecida como Saigon, a maior cidade do Vietnam. O Vietnam, como todos sabem, fica na Ásia, na região conhecida como Indochina e suas fronteiras são: China, ao norte; Mar da China ao leste e ao sul; Laos e Cambodia a oeste. O Vietnam foi colônia da França de 1858 até a Segunda Guerra quando foi invadido pelo Japão. Com a derrota do Japão e impotência da França em retomar o território, o país viu-se envolvido numa nova disputa interna que acabou transformando-o em Vietnam do Sul e Vietnam do Norte. Saigon era a capital do sul, anti-comunista e apoiado pelos USA durante a guerra. Em 1973, os americanos derrotados deixaram a área que reunificou-se como República Socialista do Vietnam. Saigon, tomada pelo Vietcong – Frente de Libertação do Sul – passou a chamar-se Ho Chi Minh. Bem, sempre fui péssima em História e esse é o resumo do resumo de tudo que li ultimamente sobre o país. Cheguei a uma idade em que os fatos históricos que os jovens aprendem na escola, me foram passados por Gontijo Teodoro, o famoso Repórter-Esso, na época em que aconteciam e minha vontade de conhecer o Vietnam nasceu na década de 60.

Oooops! Quase que não continuo a viagem! Tive que sair do avião e fazer todo aquele procedimento de passar pelo raio-x em Singapura. O pior (piooorrr, como diria o Anderson) é que ninguém da tripulação sabia me dizer o que fazer no aeroporto. Saí, passei pelo raio-x e fui procurar o aviso do meu vôo. Lá dizia que ainda não havia previsão de qual seria o portão de entrada e decidi rever o jardim dos fumantes, o point mais agradável do aeroporto de Singapura. Na volta, ao olhar para o quadro, avisava que o avião estava fechando os portões. Saí correndo feito uma louca até chegar ao portão de embarque onde, de longe, um funcionário já perguntou, “Ms. Telma Silva?”, o que não é um bom sinal... Enquanto a atendente verificava meu cartão de embarque, outro avisava alguém pelo rádio que “agora” podiam fechar. Então, cá estou eu de novo, sentada no meu assento privilegiado (o primeiro da classe econômica, aquele que a mesinha sai do braço da poltrona), me deliciando com um legítimo pãozinho indonésio recheado com chocolate e lambendo os beiços, já que até agora, no ar, a Lion Air não tinha me servido nem um copo d`água.

Voltando à história do Vietnam, quando conheci Timor-Leste e sua história de bravos guerreiros, pensei logo que Timor estava para a Indonésia, assim como o Vietnam do Norte estava para os Estados Unidos. Não vou ficar no Vietnam tempo suficiente para conhecer os vietnamitas como conheço os timorenses, mas espero que jamais me decepcione com os vietcongs da forma como estou decepcionada com os mauberes...

Se você tem uma lembrança muito bonita de algum lugar ou de alguém que conheceu superficialmente, guarde-a no fundo do coração e use-a quando precisar de alento. Se o destino o afastou de algo, não lute contra ele. Tudo e todos têm o seu tempo de permanência em nossas vidas e a aceitação da impermanência é uma arte a ser desenvolvida por todos que buscam o crescimento espiritual. Eu me dei ao trabalho de tatuar “Iluminação” na minha nuca, mas não aceitei que meu tempo em Timor havia chegado ao seu termo em 2006. Primeiro tive a fase de negação, passando um longo tempo sem mesmo acreditar que tivesse deixado aquela terra onde vivi uma grande experiência. Daí, pulei para a fase da luta, brigando feito uma tigresa apanhada numa armadilha, fazendo possível o que parecia impossível: voltar a Timor-Leste pela Capes.

Pensei em continuar escrevendo, “Como me arrependo”, mas pensei melhor e não vou dizer que esteja realmente arrependida. Não que eu tenha problema algum em me arrepender ou admitir que errei, mas em consideração às pessoas que reencontrei – e nisso a vinda para Timor valeu muito a pena – como às pessoas que conheci e aprendi a admirar, não posso considerar que essa segunda missão em Timor tenha sido um total fracasso. Teria sido melhor ter ficado onde estava, tocando minha vida para a frente e guardando as lembranças de Timor com muito, muito carinho. No futuro, infelizmente, quando eu pensar em Timor, vou lembrar dos timorenses que trabalham comigo no Profep e que, na maioria (não todos), são capazes de atraiçoar como os crocodilos que consideram sagrados. Fingem que estão dormindo e quando você acredita que esteja a salvo, tiram a cauda de baixo da água e dão uma rabanada no pescoço pra desnortear e poderem devorar a presa calma e vagarosamente. Estou falando sobre crocodilos? Não, refiro-me aos meus “caros colegas” timorenses.

Só para ilustrar melhor a situação e não ficar parecendo aqui que estou procurando sarna pra me coçar, deixa eu contar um rápido episódio que mostra bem o tipo de gente com quem estou lidando.

O Profep é o Programa de Formaçao de Professores da Escola Primária. Há uma nova Lei de Bases da Educação e a escola primária não existe mais e, dessa forma, o diploma do Profep não ajuda os professores timorenses em muita coisa. Bem, mais um equívoco da cooperação entre os dois países, e a solução para esse problema seria que, agora que os cursistas do Profep têm o antigo nível médio completo, eles podem continuar seus estudos e fazer o Bacharelato que, em Timor, equivale a uma Licenciatura. O problema é que os timorenses gostam de cortar caminhos e talvez por isso tenham conseguido emboscar as milícias indonésias. Outro problema é que eles também não estão satisfeitos com a ajuda que recebem, apesar de jamais dizerem isso e estarem sempre sorridentes e aparentando submissão. A quase totalidade dos cursistas do Profep tinha um nível de escolaridade muito próximo do zero e diferenciavam-se de outros em suas aldeias só por não serem completamente analfabetos. Nenhum outro programa no mundo os certificaria no nível médio depois de dois anos de estudo à distância. Mas isso não foi suficiente para eles...

Na segunda-feira da semana passada o Professor Francisco me procurou dizendo que a direção do Instituto nacional de Formação Profissional e Contínua (INFPC) estava querendo que, além do diploma do Profep, também fosse dado aos cursistas um certificado atestando que eles t6em nível de bacharelato. Professor Francisco é aquele que, tecnicamente, está preparado para ser o futuro coordenador do Profep-Timor, caso continue existindo. Bem, diante dessa solicitação absurda eu respondi que o Profep jamais poderia dar esse certificado porque isso não é verdade e Francisco agradeceu com aquele sorriso de sempre. Na quarta feira ele apareceu com uma nova versão do diploma. Em lugar dos bonequinhos que são a logomarca do Profep, eles queriam o mapa de Timor-Leste e onde dizia, “Ensino Secundário - Modalidade Docência, para o exercício do Magistério nas classes do Ensino Primário” deveria vir “Ensino Secundário - Modalidade Docência, para o exercício do Magistério nas classes do Ensino Pré-Secundário e Secundário”, ou seja, eles deram um “jeitinho” de fazer valer o diploma do Profep como um diploma de Bacharelato! Eu disse ao Professor Francisco que, se queriam tantas mudanças, que eles mesmos as fizessem no bendito diploma e dei por encerrada minha participação no assunto, mas não sem antes alertar a Ana Valéria.

Um parênteses se faz necessário. Com a saída da Senhorinha, a tutora do Profep, nosso grupo ficou acéfalo, mas tudo continuou a funcionar da mesma forma, comprovando a inutilidade da figura da tutora/coordenadora no programa. A Coordenação Pedagógica da Universidade de Santa Catarina decidiu que Vladimir e Francisco fariam uma gestão participativa até a chegada de uma nova tutora, mas na verdade ninguém nos disse isso oficialmente, tanto que até a data da partida do grupo de novos professores que chegou a Dili, se não me engano, no dia 29 de agosto, as duas pedagogas iriam, uma para o Procapes e a outra para a UNTL. Enquanto eles estavam em trânsito no Chile, receberam um e-mail da UFSC nomeando a Ana Valéria como tutora do Profep, o que desagradou a alguns já que, além de não ter havido processo seletivo para preenchimento dessa vaga, escolheram exatamente uma pessoa que não tem a titulação exigida para o cargo. A pedagoga que foi para a UNTL é mestre em Educação e há um professor de Matemática que também é graduado em Pedagogia, além de ter o mestrado em Educação. Porque escolheram a Ana Valéria será mais um dos mistérios da Capes, mas sei que ela está lá e precisamos ter alguém que assine os documentos, daí a minha preocupação em avisá-la do que estava sendo armado pelos professores timorenses. Ana Valéria me agradeceu muito pelo alerta e imediatamente chamou o Francisco para uma conversa. O curioso foi que ela pareceu tão agradecida pelo meu aviso que achei que eu seria merecedora de algum retorno, o que jamais aconteceu.

Na sexta-feira houve uma cerimônia de encerramento da Semana presencial do Profep, e aconteceu de eu me sentar exatamente ao lado do Professor Francisco. Resolvi perguntar o que havia sido decidido a respeito do diploma e ele respondeu que a nova tutora iria consultar Brasília para que a orientação viesse diretamente do MEC. Ponderei que esta era uma sábia decisão, mas adiantei que o pedido seria negado, pois o MEC jamais certificaria os cursistas do Profep para lecionar no curso secundário. Professor Francisco me olhou com aquele sorriso falsamente inocente que só os timorenses sabem ter e disse que jamais pedira para que a certificação fosse para Pré-Secundário e Secundário e sim para Primeiro e Segundo Ciclos da Educação Básica. Pensei que fosse uma piada e quando disse que era isso que estava escrito no rascunho de diploma que ele me mostrara dois dias antes, Francisco negou sorrindo e me olhando nos olhos. Insisti dizendo que era o que estava escrito no papel e que ele, inclusive, não me deixara nem ficar com uma cópia alegando ser a única que tinha. Sempre rindo, ele respondeu que o papel estava na sala da Agência e que podia me mostrar como estava escrito Primeiro e Segundo Ciclos. Olhei para ele abismada e disse que entendia que ele também não me pedira, na segunda-feira, que fizesse um certificado dizendo que o Profep tinha nível de Bacharelato. O sínico e ordinário, rindo e me encarando, respondeu, “Claro que não, professora, eu jamais pediria uma coisa dessas...”.

Eis aí uma das muitas razões para eu estar tão amarga e com tanta vontade de sair de Timor. Depois dessa conversa com o Professor Francisco, saí do auditório e fui pra casa vomitar e chorar um pouco e agora que já eliminei um pouco a minha raiva e decepção pelos olhos e pela boca, estou literalmente cagando e andando para o futuro do Profep-Timor e de seus cursistas.